SINOPSE | Portela: "GuajupiĆ”, Terra Sem Males"

by - agosto 10, 2019




IRIN-MAGƉ, PAJƉ DO MEL, POVOADOR DA TERRA...
 
Todas as bĆŖnçãos criadas por MonĆ£ (o Deus dos TupinambĆ”s) trariam felicidade e contentamento a todos os seres aqui existentes, menos para o homem. Insurgentes, desprezaram tudo o que generosamente lhes fora dado. 
 
Então veio castigo. O fogo desceu do céu e destruiu tudo sobre a terra. Apenas um homem considerado digno, foi poupado desse castigo. Seu nome era Irin-Magé.
 
Levado para o céu ele, aos prantos, diz à Monã, que seria difícil viver sem pares nesse imenso vazio. Comovido, Monã reverte a situação, e fez com que caísse um dilúvio sobre a terra. Dessa Ôgua surgiram os oceanos, os rios e tudo frutificou.

MonĆ£ entĆ£o deu a Irin-MagĆ© uma mulher e o mandou de volta Ć  terra para que ele a repovoasse de homens melhores. Dentre os muitos de seus filhos, nasce um em especial que se tornaria o grande guru, o grande karaĆ­ba, "o profeta transformador", chamado MaĆ­ramĆ»ana. 
 
Familiar de MonĆ£, MaĆ­ramĆ»ana aprendera a arte de transformar tudo o que quisesse de acordo com sua vontade nas mais diversas formas; de animais, pĆ”ssaros, peixes e para punir os homens podia transformĆ”-los tambĆ©m ao seu bel-prazer. 
 
Ɖ esse profeta-guru, dotado de poderes e conhecimentos "sobrenaturais" e misteriosos, quem ensinarĆ” todas as prĆ”ticas sagradas, todos os costumes e regras da organização social das tribos tupinambĆ”s.
 
 
BAƍA DA GUANABARA, NOSSO GUAJUPIƁ
 
Na beleza do azul sobre o azul, da calma sobre a calma, um curso d'Ɣgua serpenteia num vale de Ɣrvores verdes e frondosas. Em todas as direƧƵes a floresta Ʃ vƭvida. HƔ que se fiar no Sol, a luz Ʃ cultivada e tudo deve ser puro.
 
O rio é o caminho, é sagrado, tem peixe, tem marisco. As aves voam livres, colorindo o céu. Temos tudo ao alcance das mãos, Ôgua de beber, de lavar e de se banhar. Vivemos a vida em profunda gratidão.
 
Mas alĆ©m de pescar e caƧar, somos tambĆ©m bravos guerreiros. Só aqueles que enfrentam a morte, sem medo, conseguem encontrar o GuajupiĆ”. Os tupinambĆ”s representavam esse paraĆ­so como um lugar idĆ­lico, recoberto de flores e regado por um maravilhoso rio, em cujas margens viam-se enormes Ć”rvores. 
 
E nenhum lugar poderia ser tão igual ao imaginado GuajupiÔ eterno do que um Rio de Janeiro ainda virgem.
 
 
 
NASCE UM KARIƓKA
Chemembuira rakuritim, chemebuira rakuritim (eu jĆ” vou parir, eu jĆ” vou parir)
 
Nasce um tupinambÔ. Ritos e tradições serão seguidos, para assegurar bons pressÔgios. Unhas de onça e garras de Ôguia, ornarão o berço-rede, para garantir que nada de mal lhe aconteça.
 
Pai, mĆ£e, filhos, avós, tios, tias, primos e primas, se juntam, estĆ” formada a maloca, a casa coletiva da tribo. Cercando o okara (grande quintal) se construĆ­a uma taba. Karióka, a lendĆ”ria taba tupinambĆ”, surge majestosa Ć  esquerda da paradisĆ­aca baĆ­a de kƻƔnĆ£parĆ”. 
 
O homem roƧava a terra, plantava, fabricava canoas, arcos, flechas, tacapes, adornos de penas multicoloridas. Eram eles os responsĆ”veis pela seguranƧa das tabas.  E sua função primordial era a de ensinar a arte da guerra.
 
ƀs mulheres eram imputadas as rĆ­gidas tradiƧƵes e responsabilidades tribais, cuidavam da horta, participavam da pesca, fiavam algodĆ£o, teciam redes, fitas para amarrar nos cabelos e faixas para amarrar as crianƧas, tranƧavam cestos em junco e vime, manuseavam o barro para produzir panelas, vasilhas e potes, e mantinham acesos os dois fogos junto a rede do chefe da famĆ­lia. Eram o sustentĆ”culo para o "esforƧo de guerra" tĆ£o cultivado pelo tupinambĆ”s.
 
Aos mais velhos cabiam repassar oralmente as histórias, o saber, e as orientações do que deveriam fazer, aos ainda jovens, em cada fase de sua vida.
 
Os tupinambÔs acreditavam que o homem tinha duas substâncias essenciais: uma eterna e outra transitória e ambas, o corpo e a alma, estavam ligadas.
 
 
 
KAƛƍ, A BEBIDA "DOS DEUSES"
 
Ɠ vinho, ó bom vinho! Jamais existiu outro igual!
Ɠ vinho, ó bom vinho! Vamos beber Ć  vontade.
Ɠ vinho, ó bom vinho! Ɠ bebida que nĆ£o dĆ” preguiƧa!
 
Peguem as canoas! Passem pelas tabas: Yabebira – a aldeia maracanĆ£, a do Peixe PirĆ”, de EiraiĆ” – atual IrajĆ” - e sigam em direção a GuirĆ” GuaƧu, a aldeia com nome de Ć”guia, porque a festa vai comeƧar!
 
Ao som dos marakƔs, chocalhos, flautas, tambores, pƭfanos e apitos, cantamos e danƧamos. Tem que ter Kaƻi ou Cauim, o licor sagrado que tanto adoramos.
 
A bebida era feita de raízes e frutos. As propriedades inebriantes do cauim eram feitas pela mastigação, e esse processo era considerado místico. Só mulheres, as mais lindas e puras, podiam participar da fabricação do "vinho". Os tupinambÔs eram beberrões respeitados e era difícil acompanhÔ-los. A festa poderia durar vÔrios dias, enquanto houvesse bebida, porque disposição para consumi-la não faltaria.
 
... E todas as bênçãos criadas por Monã (o Deus dos TupinambÔs) trariam felicidade e contentamento a todos os seres aqui existentes, menos para o homem. Insurgentes desprezaram tudo o que generosamente lhes fora dado. Então veio castigo...
 
Um Rio teve que acabar para que outro pudesse surgir. Como poderia ter sido se tivéssemos respeitado a diversidade étnico-cultural? Enterrados no esquecimento perdemos o elo com nossa ancestralidade primal, perderam eles, perdemos nós, absurdamente privados dessa experiência!
 
 
GUAJUPIƁ, O QUE FIZEMOS DE TI?
 
Essa coisa do azul sobre o azul
Da calma sobre a calma
ƀs vezes me cansa
ƀs vezes me acalma
Eu paro no sinal vermelho
Uns pedem dinheiro
Uns sacam o revólver
Um outro expõe a própria dor
Segue o asfalto
MetƔlico fluxo
Saudade Ć© um retrovisor
 
HĆ” que se fiar no sol
E cultivar a luz
Purificar o pus
Deus
 
Assisto a vitória do bronco, do bruto
Do sínico e da servidão
Segue o espetƔculo
No estƔdio, na tela
Parlamentam sobre a escrotidão
Mas quando a tribo invadir a floresta
Subindo atƩ o SumarƩ
E deslinkar a torre, o Brasil
Meu mano então como é que é?
 
HĆ” que se firmar na terra
O teto, o viaduto
Proliferar o fruto
Deus
(em memória - letra da música "Palas Superficiais", de Marco Jabu)
 
 
"Cavam em busca de uma coisa
Que se sente estar profunda
Mas que foge e se esquiva
Quando chega Ć  superfĆ­cie
Uma coisa que estĆ” ali
Numa terra de mistĆ©rio". 
(Poema de Joaquim Cardozo)                                                                                 
                                                                         


Autores: Renato Lage e MƔrcia Lage
 
 
 
BIBLIOGRAFIA:
 
- O RIO ANTES DO RIO
Autor: Rafael Freitas da Silva
Editora: BabilƓnia
 
- O POVO BRASILEIRO
Autor: Darcy Ribeiro
Editora: Companhia de Bolso
 
- DUAS VIAGENS AO BRASIL
Autor: Hans Staden
Editora: L&PM Pocket Descobertas
 
- DocumentĆ”rio Guerras do Brasil.doc – episódio 1 (NETFLIX)
Criação: Luiz Bolognesi

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